quarta-feira, 5 de dezembro de 2007

Uma concursada e os temporários

O tema relativo aos servidores temporários tem tomado conta do noticiário local. Quanto ao assunto, senti necessidade de expressar minha opinião como simples cidadã, aproveitando este precioso espaço que é destinado a pessoas do povo como eu. Ressalte-se que esses espaços são raros. Ao emitir minha opinião, sei que receberei críticas de milhares de pessoas, principalmente das que estão diretamente envolvidas na situação. Mas tenho certeza, também, que outros milhares pensam como eu.
A Constituição Federal autoriza em seu art. 37, inciso IX que a lei estabeleça os casos de contratação por tempo determinado para atender a necessidade temporária de excepcional interesse público.
Nesse sentido, o significado de excepcional quer dizer em que há exceção, relativo à exceção, extraordinário, não rotineiro, imprevisto ou inesperado. A necessidade decorrente de interesse público, por conseguinte, não é a que decorre de conveniência da administração ou do interesse do administrador, e sim a necessidade voltada para o bem comum, portanto, de toda a coletividade.
Sendo assim, podemos vislumbrar que a necessidade em questão não se refere a dificuldades operacionais habituais, cotidianas na execução da atividade estatal e que podem ser realizadas pelos servidores efetivos da administração pública. Não se trata também daquelas necessidades que não cheguem a causar transtornos ou prejuízos por sua inexecução. Deve-se traduzir tal necessidade por sua essencialidade, relevância e eventualidade.
Ressalta-se que a contratação desse serviço será sempre por prazo certo enquanto perdurar a excepcional situação, devendo ser fixada sua temporariedade para que se evitem abusos por parte dos governantes.
Diante do exposto, pergunto às autoridades e aos que defendem a manutenção dessa situação: os cargos ocupados pelos temporários, tais como agente de artes práticas, auxiliar de informática, agente administrativo, agente de operações gráficas, agente de portaria e outros, estão atendendo aos preceitos traçados no dispositivo constitucional de execepcionalidade, essencialidade e temporariedade? Penso que tais cargos pertencem a cotidiano da administração pública, que fazem parte de sua 'engrenagem', que fazem a máquina administrativa funcionar e, portanto, não podem ser eventuais ou excepcionais, devendo, dessa forma, ser ocupados por servidores efetivos, concursados.
Desejo compartilhar, ainda, a tese de que houve descumprimento da Constituição Federal. Se isso é verdade, quem descumpriu a Constituição Federal, quem cometeu essas irregularidades de tornar permanente o que é temporário? Quem descumpre a lei não tem que ser punido? Nesse cenário, penso que são responsáveis os governantes que eternizaram essa situação, os temporários porque calaram, aceitando uma situação, mais do que irregular, ilegal, inconstitucional. Chamo a atenção também para o fato de que os nomes listados não pertencem apenas às classes mais necessitadas.
Quero trazer à reflexão a situação dos cidadãos que cumprem a lei e a defendem, que pagam seus impostos, que mereceriam ser consultados nessa questão, aqueles que ficam batalhando todos os dias para conseguir um emprego, os que estão à espera da realização de concurso público, estudam, estudam e os que passaram e estão aguardando até hoje para ser chamados e não foram, porque os temporários estão ocupando seu lugar de direito.
Questiono os parlamentares ditos representantes do povo que, numa atitude eleitoreira, se levantam para tentar legalizar uma situação ilegal de mais de 20 anos. Tentam alterar a Constituição. Ora, mas a alteração vale a partir de sua publicação, ou seja, para frente. Será que se pode legalizar uma situação passada que ela proibia? Ela foi desrespeitada e agora se insurgem para desrespeitá-la ainda mais. Isso, para mim, é golpe.
Clamo aos representantes do povo que pensem na maioria da população para tomar uma decisão de tamanha importância, efetivar no serviço público servidores que não passaram por concurso público, este sim, um instituto constitucional que deve ser exaltado porque é universal, não tem cor, não tem sexo, não tem classe e torna claro que todos são iguais perante a lei. Espero que os parlamentares e os governantes refletiam sobre a importância da moralidade pública. E isso passa obriga a obedecer à Constituição sobre a qual juraram respeitar ao assumir seus mandatos delegados pelo povo.
Para concluir, saúdo o Ministério Público, que cumpre com a sua obrigação de guardião dos interesses públicos. Manifesto-me pela demissão desses servidores com o pagamento de indenização de todos os direitos trabalhistas que tal situação gerou.
Ana Lydia Azevedo
Servidora pública municipal concursada em Belém
* Artigo publicado no Jornal O Liberal no dia 18/11/2007

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