domingo, 16 de janeiro de 2011

Planejamento Urbano: um dever do poder público *

O século passado foi caracterizado pela rápida urbanização das cidades brasileiras. Para que tenhamos idéia da dimensão da urbanização brasileira, atualmente, em torno de 80% dos brasileiros residem nos centros urbanos.
Entretanto, o fenômeno da urbanização brasileira não foi acompanhado de um racional e efetivo planejamento estatal, fazendo com que as cidades crescessem horizontal e informalmente, gerando um enorme passivo socioambiental nos centros urbanos.
Um dos resultados da inércia estatal são as áreas ocupadas informalmente e sem regularização fundiária, cujo exemplo mais evidente são as favelas urbanas sejam elas em áreas planas do território ou em morros.
Em verdade, a história do incipiente planejamento das cidades coube, quase que exclusivamente, aos arquitetos e urbanistas e talvez por isso não tenha alcançado um grau de eficiência aceitável.
A problemática da urbanização é tão séria que tenho a convicção que uma mitigação da mesma só será possível quando técnicos e profissionais de várias em áreas do conhecimento humano, em comunhão total, reflitam sobre qual a cidade que queremos.
Sendo assim, arquitetos, urbanistas, geógrafos, economistas, juristas etc ... devem aprofundar seus estudos para que, em um médio prazo, possamos habitar cidades com maior qualidade ambiental, mais salubres e por que não, mais felizes.
Todavia, será totalmente ineficaz a criação do conhecimento acadêmico se o poder público não utilizá-lo. São necessárias: vontade e conscientização política.
Por sua vez, as municipalidades, com o auxílio dos governos estaduais e federal, têm o dever de criar equipes técnicas integradas e competentes que possam elaborar propostas factíveis capazes de promover a regularização e o ordenamento do território das cidades e das metrópoles.
É necessário deixar a política em um segundo plano e priorizar a alternativa técnica, por mais que a mesma seja antipática. O interesse público deve prevalecer sobre o interesse individual e tal lógica é principiológica.
O conjunto de propostas que podem ser elaboradas, sem dúvida, apresentarão um caráter interdisciplinar, mas será inevitável que estejam de acordo com o ordenamento jurídico urbanístico constitucional e infraconstitucional brasileiro.
Este é um obstáculo que precisa ser vencido, o Direito Urbanístico e sua interface com o meio ambiente, seus princípios e regras, precisa ser visto através de outras lentes de modo que ele venha a ser respeitado e levado em consideração nas decisões judiciais, pelos parlamentos e pela sociedade.
É para assustar você leitor, pois apesar da evidente crise urbana pela qual estamos atravessando, fique sabendo que os currículos dos cursos de Direito no Brasil não possuem a disciplina Direito Urbanístico a não ser que seja uma disciplina optativa. Tal fato ratifica a falta de importância atribuída ao estudo das normas, princípios e regras do Direito Urbano-ambiental e o resultado é este que estamos observando cotidianamente pela imprensa, ou seja, o caos urbano: no transporte, na habitação, no saneamento básico, na saúde e na moradia.
Com afirmei acima, estamos diante uma questão muito séria e para ratificar a seriedade do debate não seria necessário mencionar as catástrofes ocorridas na região serrana do Estado do Rio de Janeiro onde até agora mais de 500 seres humanos pagaram com suas vidas o preço da incompetência e descaso do Poder Público.
Alguns dirão que foi uma catástrofe natural e que nada poderia ter sido feito tamanha a força da natureza. Peço desculpas àqueles que pensam dessa maneira e ousarei discordar, pois o que está ocorrendo nas cidades do Rio de Janeiro e em quase a totalidade das cidades brasileiras é sim um desastre, mas uma catástrofe administrativa e de gestão das cidades.
As municipalidades viraram as costas de maneira criminosa para a problemática da regularização e do ordenamento das cidades e metrópoles brasileiras, propiciando que tragédias como as que somos obrigados a ver nos telejornais repitam-se a cada ano e de maneira mais contundente.

BRUNO SOEIRO VIEIRA
é Auditor Fiscal, Mestre em Direito e Professor.
(brunovieira@fap-pa.edu.br)

* Artigo publicado no jornal Diário do Pará no dia 16/01/2011.